Fonte: Caldeirão Juridico.
Essa é para você
estudante de Direito. Entenda a diferença entre os crimes de calúnia,
difamação e injúria, conheça as peculiaridades desses crimes contra a
honra que estão previstos nos artigos 138 à 145 do Código Penal (CP).
Pois bem, não muito raro presenciamos cenas que perfeitamente se
encaixariam num dos delitos tipificados como calúnia, difamação ou
injúria, ou mesmo ficamos sabendo por intermédio de terceiros da fatos
que levam à sua incidência, me arisco a dizer inclusive que, de certo,
em um dado momento de nossa vida algum desses crimes sempre acabará
ocorrendo conosco, sendo vítima ou autor, de tão comum e simples que é a
sua ocorrência.
A grande questão está em distinguir, a partir de que momento a
incidência desses delitos nos afetará ao ponto de termos que recorrer à
solicitação da tutela jurisdicional, criando, portanto, uma lide a ser
resolvida.
Primeiramente, vamos esclarecer que não há crime sem lei anterior que o defina e nem pena sem prévia cominação legal.
É o que está descrito no art. 1º do CP, isso significa dizer que, o
crime deve estar devidamente tipificado em norma penal incriminadora
para que o sujeito/agente do delito possa ser punido (princípio da legalidade ou reserva legal).
Ademais, derivados do princípio da legalidade ou reserva legal constante no art. 1º do CP, estão ainda os princípios da irretroatividade e da retroatividade benéfica
da Lei, sendo o primeiro a impossibilidade da Lei retroagir para
prejudicar o sujeito/agente. Por exemplo: Sujeito pratica um ato que um
mês após sua prática foi tipificada como crime através de texto de Lei,
nesse caso a Lei não retroagirá para incriminar o sujeito/agente, pois, à
época do fato não havia Lei que definisse a conduta praticada como
crime.
Já no caso da retroatividade benéfica, a Lei pode retroagir se form
para beneficiar o sujeito/agente da conduta tipificada como crime, nesse
caso, havendo Lei penal incriminadora tipificando a ação do agente,
esta será um crime, entretanto, se antes mesmo de seu julgamento surgir
outra Lei que revogue a anterior na parte em que considera a conduta
como crime, o sujeito se beneficiará da nova Lei e, portanto, sua
conduta passa a ser atípica. Outro exemplo disso, trazendo para a
realidade do nosso Código Penal, são os crimes "românticos" por assim
dizer, tais como o antigo crime de sedução previsto pelo art. 217 do CP,
que foi revogado. Esse artigo descrevia como crime "seduzir, mulher
virgem, menor de 18 (dezoito) anos e maior de 14 (catorze) anos, e ter
com ela conjunção carnal, aproveitando-se de sua inexperiência ou
justificável confiança". De igual modo ocorre com o adultério que anteriormente era considerado crime (art. 240 do CP - revogado).
Muito bem, feitas essas considerações, passaremos então para a nossa proposta inicial, os crimes contra a honra e, já para começar, lhes direi que eles podem ser resumidos em 3 (três) palavras que mais adiante explicaremos o por que. São elas: mentira, fofoca e xingamento.
1. CALÚNIA - Mentira (art. 138, CP). Ora, como vimos
podemos resumir os crimes contra a honra em três palavras, no caso da
calúnia, ela é sinônimo de mentira sobre a prática de um crime, ou seja,
o sujeito/agente imputa, falsamente (mentira), à alguém fato descrito na norma penal como crime. Ademais, exige a publicidade
do fato para que o crime seja consumado. O §1º do art. 138 dispõe ainda
que incorre na mesma pena quem, sabendo ser mentira o fato imputado, o
propala ou divulga e, o §2º do mesmo artigo preconiza ainda ser possível
a calúnia contra os mortos inclusive.
Outra característica desse crime é que, admite-se a forma tentada,
ou seja, o agente iniciou/preparou a execução do crime, mas, não o
consumou. Por exemplo, o sujeito escreve um e-mail para um terceiro
imputando fatos descritos como crime sobre seu colega de trabalho, seu
colega de trabalho, aproveitando que o outro havia saído para tomar um
café, olhou o e-mail no computador, leu, copiou seu teor e o apagou,
interrompendo assim a consumação do delito. Nesse caso houve a forma
tentada do crime.
E por ser mentira, afeta a honra objetiva da vítima/ofendido (a imagem, reputação).
Ok, então se eu contar uma mentira sobre alguém que seja descrita
como crime e torná-la pública estarei cometendo o crime de calúnia, mas,
e se o fato imputado ao terceiro, embora descrito como crime, seja
verdadeiro? Ou seja, o sujeito contra quem foi imputado o fato delituoso
realmente cometeu o crime. Ora, nesse caso, admite-se a prova da verdade (exceção da verdade),
isto é, você deve provar que suas imputações são verdadeiras e, já que a
tipicidade do crime de calúnia se funda na mentira, não haverá,
portanto, crime (art. 138, §3º, CP).
Entretanto, o §3º, incisos I, II e III do art. 138 possui algumas exceções, casos em que mesmo sendo verdadeiras as suas acusações não se admitirá a prova da verdade. As exceções são as seguintes:
- Se, constituindo o fato imputado crime de ação privada, o ofendido não foi condenado por sentença irrecorrível;
- Se o fato é imputado a qualquer das pessoas indicadas no nº I do art. 141;
- Se do crime imputado, embora de ação pública, o ofendido foi absolvido por sentença irrecorrível.
Os indicados no nº I do art. 141 do CP são: Presidente da República, ou chefe de governo estrangeiro.
Háaaaa....então mesmo se o Presidente da República estiver roubando a
Administração Pública de forma escancarada eu não posso acusá-lo de
estar cometendo um crime contra Administração Pública por exemplo!? Não.
Não pode, porque não compete a você fazer essa acusação e sim aos
órgãos competentes, cabe a você como cidadão denunciar perante o
Ministério Público Federal ou Tribunal de Contas da União por exemplo.
2. DIFAMAÇÃO - Fofoca (art. 139, CP). A difamação é sinônimo de fo-fo-ca, isso mesmo, fofoca e, portanto, exige também a publicidade para o crime se consumar, crime este que afeta também a honra objetiva
do ofendido (imagem, reputação). Exemplo: Haaaa...minha vizinha falou
que eu sou corno. Sua vizinha falou, mas, falou para alguém e, portanto,
sua vizinha está fofocando, está tornando público fatos que denigrem a
sua imagem, a sua reputação, cometendo assim o crime de difamação.
Em suma, tudo aquilo que é dito sobre você e afete a sua imagem ou
reputação (honra objetiva), que não seja descrito como crime e tenha
sido levado a conhecimento de terceiro (publicidade), pouco importando
se é verdade ou mentira, é considerado difamação.
Assim como na calúnia, a difamação também admite a forma tentada.
Exemplo: Escrevo uma mensagem no meu celular falando que o Fulano é o
maior corno caloteiro da cidade e envio ao meu colega Beltrano, só que,
meu colega Beltrano esqueceu o celular dele na mesa da recepção aonde o
Fulano trabalha, Fulano ler a mensagem e, após encaminhar uma cópia para
si para tomar as devidas medidas legais posteriormente, a apaga. No
exemplo citado o fato não chegou ao conhecimento de terceiro porque
houve uma intervenção para que o crime não se consumasse, portanto,
houve a tentativa.
OBS¹.: Diferença entre honra objetiva e subjetiva. No primeiro caso, o crime deve afetar a imagem, a reputação do indivíduo, o crime necessariamente deverá ser levado a conhecimento de terceiro para se consumar. Ora, como irei causar um dano à sua imagem ou reputação se só você sabe o que falei? É exatamente isso, o dano à imagem e à reputação pressupõe a existência da publicidade, de tornar público o fato. Já no caso da honra subjetiva, a mesma se refere ao foto íntimo do ofendido, aos juízos de valores que este tem sobre si mesmo, à sua dignidade, por isso a subjetividade e a desnecessidade da publicidade.
Ok, cabe ainda dizer que, a difamação também admite a prova da verdade
(art. 139, parágrafo único), aqui de uma forma mais restrita quanto aos
sujeitos, cabendo somente se o ofendido é funcionário público e a
ofensa é relativa ao exercício de suas funções (Veja o artigo já publicado aqui sobre Desacato, mera crítica ou exceção da verdade).
Exemplo: Você vai a um órgão público com um amigo e, mediante a
morosidade do servidor para lhe fornecer a informação solicitada você
chama o mesmo de lerdo, de líder da operação tartaruga da repartição,
etc.
3. INJÚRIA - Xingamento (art. 140, CP). A injúria é um xingamento (ex: seu corno safado, filho de uma pu...) destinado a uma pessoa, não havendo a necessidade da publicidade do ato para que o crime seja consumado, bastando que o próprio ofendido tome conhecimento. Afeta a honra subjetiva
do ofendido (foro íntimo, o juízo de valor que o próprio sujeito tem de
si, a sua dignidade), está relacionada diretamente com uma
característica própria do ofendido. Também admite a tentativa.
Tenha em mente que, a tentativa é possível nos crimes contra a
honra sempre que, o meio de execução torne o crime plurissubsistente,
como por exemplo, através da forma escrita. Ex: carta interceptada
por terceiro. Fato curioso sobre a injúria é que, embora admita a forma
tentada, o agente que iniciou a execução da conduta típica não será
punido pela tentativa, pois, o crime de injúria é de consumação instantânea, ele se consuma no momento em que o ofendido tem conhecimento das palavras de ofensa. Ademais, os crimes contra a honra são crimes de ação penal privada,
em que é necessária a queixa-crime para provocar o Judiciário e, nela
deverão constar todas as palavras proferidas contra o ofendido, mesmo
que de baixo calão.
Assim, o ofendido precisa saber da existência da ofensa para tomar
alguma providência e, no momento em que a vítima do crime que, até então
era tentado, fica sabendo das ofensas, o crime se consuma e deixa de
ser tentado.
E o que é Injúria Real?
A injúria real é quando a ofensa passa para as vias de fato, se
torna física, embora não haja lesão corporal. O intuito da injúria real é
ofender o decoro, a dignidade, com a intenção de abater o ânimo do
ofendido. Pode-se dizer ainda que, é crucial que a agressão seja
aviltante ou que possa causar vergonha, quer pela natureza do ato, quer
pelo meio utilizado (ex: jogar merda em alguém).
No crime de injúria não se admite a prova da verdade, a contrario senso do que ocorre com a calúnia e a difamação.
OBS².: A injúria por preconceito é mais grave (art. 140, §3º), é situação agravante em que se aumenta a pena e não se confunde com o racismo, sendo este último sinônimo de segregação.
Por fim, vale fazer uma observação final quanto ao animus chocante, sendo este o xingamento com o ânimo de brincadeira, geralmente feito entre amigos, excluindo-se assim a tipicidade do crime.
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