domingo, 19 de fevereiro de 2012

Salvando os casados.


SALVANDO OS CASADOS
por Oliveira Fidelis Filho -


Já perdi horas de trabalho por não salvar um arquivo, o que me deixou muito frustrado. Já cheguei a ser grato a Deus por ter perdido pois ao construir outro texto percebi que ficou melhor, o que foi grata surpresa.

Há perdas que são grandes ganhos e ganhos que são grandes perdas.

Existem perdas que quando encaradas com honestidade, paz e sabedoria, não passam de fardos removidos, abençoadas oportunidades de vislumbrar novos horizontes, de reassumir o controle da própria vida, de reencontrar a alegria de viver.

O término de um casamento é, por princípio, acontecimento que ninguém projeta. Assumimos um relacionamento conjugal na expectativa de que só a morte nos separe. Entretanto, as estatísticas estão ai para nos acordar desta utopia.

Na verdade, todo casamento termina com a morte. Pode não ser a morte física e sim a morte do amor. Ambas podem ser dolorosas ou libertadoras.

Quando o amor vai embora o casamento fica sem alma, como um balão destituído do ar quente.

Não me refiro à morte da paixão, traiçoeira arapuca da procriação a serviço do vigor sexual, do amor romântico. Falo do amor escondido e pouco requisitado na fase da paixão mas que, quando esta arrefece, floresce no calor da amizade e frutifica no companheirismo, permitindo ao casal entardecer juntos com doçura e suavidade.

Na ausência do amor, a solidão torna-se posseira dos espaços vazios do coração sinalizando que a pior solidão é aquela sentida na companhia de alguém.

São imensuráveis os sentimentos de impotência, angústia, desilusão e revolta, quando em uma batalha perdida buscamos reanimar um casamento em cujos corações o amor desistiu de viver.

Infelizmente são muitos os que estrangulam a alma, na tentativa de salvar a aparência, a instituição. Que paralisados diante do medo de abrir mão da zona de conforto, de desagradar familiares, amigos, a sociedade ou crenças, se submete ao asfixiante cativeiro de um julgo caótico.

Não se trata de encorajar uma separação, mas encarar o fato de que permanecer juntos destituídos de amor é um ato de heroísmo e bravura sem nenhuma condecoração.

Desejar salvar um casamento, identificar a falha e possuir receitas prontas para solucionar problemas conjugais de terceiros, é pratica comum. Grande é o empenho neste sentido.

Entre os cristãos existe o empenho e o cuidado - por vezes louvável e por vezes irresponsável - de lideres religiosos em insistir no lema "o que Deus uniu não separe o homem." Entretanto, a experiência mais que a crença, mostra que não é Deus que une nem o diabo quem separa. Somos nós os responsáveis pela união e por uma eventual separação.

Tão importante quanto casar ou permanecer casado pode ser o separar e permanecer separado ou casar de novo. Se isso não é uma verdade religiosa é inquestionavelmente uma verdade do coração e da prática.

Há os que estruturam a vida quando casam e a desestruturam quando separam. Há também os que desestruturam a vida ao casarem e necessitam da separação para se refazerem.

Segundo estudos do Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo, coordenado pelo professor Ailton Amélio da Silva (especializado em relações amorosas), "cerca de 90% dos jovens consideram um casamento feliz mais importante do que construir uma carreira ou ter filhos". A pesquisa mostra ainda "que sete em cada dez matrimônios registrados no Brasil terminam em até dez anos".

Creio na importância das instituições, entretanto o ser humano é mais importante. As instituições foram criadas em beneficio do homem e não o contrário. É louvável o esforço para assegurar a durabilidade do casamento, mas deve haver igual esforço para assegurar a integridade do ser humano.

A família é ainda a Célula Mater da sociedade, entretanto, jamais deve ser a Cela Mater do isolamento, infelicidade e/ou insanidade de alguém. São muitas e graves as enfermidades psíquicas e somáticas causadas por relacionamentos conflituosos que afetam pais e filhos.

Ha lares cujo interior faz lembrar ninhos de colibri: há acolhimento, cuidado, aveludada ternura e repousante aconchego. Entretanto, há casas semelhantes a espinheiros onde ferir-se mutuamente é a regra. Fonte de silencioso ódio, explosiva ira, mágoa velada, ressentimento profundo, verdadeira fábrica de neuroses.

Uma casa é construída com cálculos, material de construção e móveis, enquanto que um lar é construído com o coração, diálogo e com harmoniosa paz.

Faz bem quem ao casar o faz não por fuga, necessidade ou tentativa de suprir qualquer carência.

Faz bem quem não aborta projetos pessoais em função de um casamento.

Faz bem quem não depende do outro para ser realizado.

Faz bem quem não se considera uma metade em um casamento e sim um ser pleno.

Faz bem quem faz todo o possível para a permanência de um relacionamento, sem abrir mão de sua dignidade, consciente de que pode viver plenamente sem ele.

Faz bem quem não entrega sua vida para que outro administre.

Faz bem quem permanece casado por amor e faz bem quem por ausência do amor do outro e por amor próprio abre mão do relacionamento.

Faz bem quem desejoso de manter os votos e pelos filhos, luta por manter o casamento; e faz bem quem não suportando mais os vetos e, por amor aos filhos, opta por ser responsável e livre.

Faz bem aquele que não depende da felicidade do outro para ser feliz, mas sendo feliz contribui com a felicidade de ambos.

É sábio o que diante do sonho desmoronado é capaz de acordar, a tempo de refazer e de reinventar o relacionamento, casar e se apaixonar outra vez com o mesmo cônjuge.

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